sábado, 12 de dezembro de 2009
Por não pensar em nota.
Despedida com gostinho de quero mais.
Serão mesmo os olhos as janelas da alma?
Se eu pudesse reduzir em algumas palavras a impressão geral que eu tive do módulo, é claro que sem escapar de cair no simplismo, eu diria que ele é construído de várias surpresas. Nossa, quão impactante foi sentir as emoções despertadas pelo documentário "Janelas da Alma". As cenas iniciais foram para mim um tanto quanto angustiantes, por me fazer reviver o trauma de infância e adolescência desencadeado pelo medo de ficar cega. Hoje esse medo já passou, no entanto, como Saramago bem lembrou em suas falas emocionadas, somos todos nós cegos, muitas vezes não de uma cegueira propriamente física, mas de uma ignorância que limita os nossos olhares, se encanta pela exuberância, mas se esquece de enxergar o simples, o detalhe, a vida. Após o filme, discutimos as impressões mútuas. Caramba, a nossa cegueira é tão diversa! Cada um se inconmodou com um olhar, uma imagem, uma lição. Agora me veio a mente um poema do escritor Horácio Dídimo que diz o seguinte:
"Um cego conduzindo outro cego conduzindo outro cego conduzindo outro
cego conduzindo outro cego
cai
todo
mundo
no
buraco"
No buraco da vida.
E a arte abre alas à sensibilidade
O primeiro tratou-se de uma pesquisa sobre os impactos do uso de agrotóxicos na saúde dos trabalhadores. Durante o mês de julho viajei para o município de Quixeré imbuída da função de entrevistar trabalhadores/as possivelmente acometidos/as por intoxicação aguda devido ao uso de agrotóxicos. Uma atividade que a princípio parecia simples transformou-se em uma das principais vivências sobre o sistema público de saúde do nosso país. Pude conhecer a realidade do precário Hospital Municipal de Quixeré, em greve há alguns meses devido as condições insalubres de atendimento e de trabalho. A greve era protagonizada pelas técnicas de enfermagem que não suportavam mais se submeter aquela situação de exploração, chegando a receber menos de um salário mínimo por mês. Os absurdos não paravam por aí, os poucos atendimentos à saúde que haviam, apenas as emergências, eram realizados por médicos que eram incapazes de olhar para os pacientes, exame físico então, era coisa de outro mundo. A cada consulta acredito que eles se desafiavam a bater o recorde de atender em menos tempo. Enquanto isso, a população de Quixeré tenta continuar sobrevivendo e de vez em quando surge alguns que reivindicam seus direitos e dignamente organizam uma greve por não entender onde foi parar aquele artigo da constituição que assegura que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado.
Outra recordação difícil de ser esquecida se concretizou há alguns meses, durante uma aula prática no módulo de ginecologia, quando eu e alguns colegas assistimos a uma consulta feita por um "médico" ginecologista. Além de bombardear as pacientes de perguntas, ele nunca as deixava responder e em quase todas as vezes induzia as respostas delas. Mesmo as pacientes tendo determinadas queixas, ele as ignorava e fugia para outra abordagem totalmente descontextualizada. Parafrasendo certo amigo meu, saí de lá, além de muito frustrada, com uma lição de como não ser médica.É, será que as coisas tem que ser assim? Não, não vou me adaptar...
Após esse momento de diálogo fraterno, fomos emocionados ao assistir a um documentário que retrata a vida de pessoas com Síndrome de Down. Foi impactante constatar como a nossa sociedade cria padrões e neles se assegura de maneira incontestável. Temos que ser iguais, nos vestir iguais, parecer iguais, pensar iguais e ter preconceitos iguais. Tudo o que soa diferente é crime, e o que é pior, é pecado. Li certa vez e gostei bastante de um comentário sobre a diversidade. Nós não devemos apenas tolerar e aceitar os diferentes, isso é muito pouco, nós devemos é estimular, se alegrar, admirar e festejar as diferenças, principalmente quando elas são desafiantes para aqueles que não estão na curva normal delineada por nossas (i)morais.
sexta-feira, 11 de dezembro de 2009
Vivência inicial no módulo.
A primeira lição do módulo foi na verdade um grande desafio, uma descrição sobre nós mesmos. Passada a apreensão coloquei no papel vários devaneios sobre uma vivência passada, dos tempos de criança, até a construção da Ada atual, em meio a todos os seus conflitos. Achei oportuno terminar a minha descrição com um poema encravado na minha vida, do poeta Thiago de Mello, o qual vou reproduzir abaixo:
Já faz tempo que escolhi
A luz que me abriu os olhos
para a dor dos deserdados
e os feridos de injustiça,
não me permite fechá-los
nunca mais, enquanto viva.
Mesmo que de asco ou fadiga
me disponha a não ver mais,
ainda que o medo costure
os meus olhos, já não posso
deixar de ver: a verdade
me tocou, com sua lâmina
de amor, o centro do ser.
Não se trata de escolher
entre cegueira e traição.
Mas entre ver e fazer
de conta que nada vi
ou dizer da dor que vejo
para ajudá-la a ter fim,
já faz tempo que escolhi.
Thiago de Mello